LOUVEIRA: Coluna de João Batista – ‘Louveirando’
Perdendo os parafusos
Lá ia eu pela Rua Armado Steck, no centro de LOUVEIRA, numa tarde chuvosa ouvindo Angelique Kidjo cantando Malaika, uma música linda que ouço quase todos os dias, quando percebi à minha frente uma máquina, que não sei bem o nome, deixando cair coisas no asfalto da rua. Á primeira vista me pareceram pelotas de barro, grudadas na roda, oriundas das estradas ao redor, por ser um dia muito chuvoso. Também percebi que essas pelotas não se dissolviam ao tocar o chão. Fiquei mais curioso ainda e logo caiu mais e mais uma, só então percebi que se tratava de parafusos, diante desta certeza, não hesitei mais nenhum momento e comecei a buzinar e dar luz alta para o motorista, mas ele, a princípio deve ter pensado que eu estava apenas tentando ultrapassar, pois ele ia bem devagar.
Não era o caso, os parafusos continuavam a cair e a roda ziguezagueava e eu previ ali um acidente, pois se a roda se soltasse, por ser muito grande e pesada, não sei bem as consequências, mas com certeza não seriam boas, penso eu agora. Continuei a buzinar, senti uma vontade enorme de filmar, mas por já ter sido multado uma vez num sábado às 23h02 numa avenida do meu bairro, por fotografar um fato, me contive.
Segui neste ritual de luz alta e buzina por uns trezentos e vinte e sete metros, e ele seguia, como acentuei, bem devagar, dando a entender que diminuíra a marcha de propósito, por irritação mesmo. Mas talvez pela minha insistência ele, o motorista, foi para o acostamento e eu, liguei o pisca alerta e parei na avenida, olhando claro, pelo retrovisor, se alguém estava muito colado ao meu carro, como acontece as vezes.
Por não haver ninguém colado ao meu carro, acenei para o motorista e disse que os parafusos da roda da máquina, traseira e do lado esquerdo para quem vai atrás, estavam se soltando um a um. Ele agradeceu meio surpreso e eu segui o meu caminho. Como o meu destino era ali bem próximo e ele parou e ficou parado por um bom tempo, então tive a chance de fotografar a máquina ali parada. Sem ser multado, ufa, consegui. O motorista ficou sentado no ponto de ônibus por um tempo, penso eu que esperando pelo socorro, e eu fui tomar um sorvete de goiaba com salada de frutas, montado por mim mesmo e batizado também por mim como “ice cream caipira”. Me permito rir agora da citação da multa e da criação do sorvete. Em dias de chuva também há motivos pra se rir, pergunte as plantas e ao rio Capivari, que, segundo ouvi, logo será alvo, no sentido bom da palavra alvo, do Projeto Tabarana.
Ri muito de mim e das analogias que podem ser feitas sobre a perda de parafusos nesses tempos tão pandêmicos. Ri, embora também tenha vontade de chorar pelo desamor que insiste em ser mais forte que o amor, como se isso fosse possível. Não, não é, e LOUVEIRA, essa cidade amorosa, acredito eu, segue o seu caminho, ora com alegrias e ora com tristezas, e por ser um micro cosmo do cosmo maior, infinito mesmo, contém todas as nuances inerentes aos seres vivos em todas as suas esferas.
Eu acredito no amor e em sua força para atravessarmos todos os momentos, os ótimos, os bons, os médios, os ruins e os péssimos. Deveria ser fácil vendo que todos falam em amor, mas não é fácil, justamente por haver uma distância imensa entre a fala e o gesto, a prática.
Trilha Sonora / Parafuso Solto / Francisco, El Hombre