VINHEDO: Secretário não quer ‘politicagem’ na discussão do Plano Diretor na Câmara
O secretário de Meio Ambiente e Urbanismo de VINHEDO, Juliano Ferragutti, vive ao lado de sua equipe e de outros integrantes da atual Administração da cidade a expectativa da tramitação, discussão, votação e aprovação do Projeto de Lei Complementar (PLC) 5/2020, que trata da revisão do Plano Diretor Participativo, definido por Ferragutti como “um plano construído para os próximos 40 anos”.
O PLC deu entrada na Câmara Municipal na última quinta-feira (13) em regime de urgência, mas o presidente do Legislativo, vereador Edu Gelmi, já adiantou que a Casa de Leis não vai aceitar a “pressa” na tramitação da proposta. Juliano considera uma decisão legislativa a retirada da urgência pedida pelo próprio prefeito vinhedense Jaime Cruz, porém espera que não haja “politicagem” na discussão do Plano Diretor dentro da Câmara.
Vale lembrar que o plano diretor de uma cidade é o mecanismo legal de orientação da ocupação do solo urbano, tomando por base um lado de interesses coletivos e difusos, tais como a preservação da natureza e da memória, e de outro os interesses particulares de seus moradores.
Juliano Ferragutti concedeu entrevista exclusiva ao jornal FOLHA NOTÍCIAS para falar da revisão do Plano Diretor, cuja versão atual foi votada em 2006 e sancionada em janeiro do ano seguinte. A atual gestão iniciou a revisão em 2015 e terminou em 2019. Uma nova análise pode ser feita a qualquer momento, entretanto o prazo máximo de revisão do plano na cidade é de 10 anos, de acordo com o secretário. O projeto do Executivo tem 320 artigos e 120 páginas.
Antes da entrevista de Ferragutti propriamente dita, cabe contextualizar a tramitação do projeto da revisão do Plano Diretor. O presidente da Câmara de VINHEDO, Eduardo Gelmi, disse na manhã desta sexta que falará com os demais vereadores para que todos peçam a Jaime Cruz para retirar o regime de urgência, que inclui prazo para apreciação da proposta de até 45 dias.
“A Casa não aceitará isso. Penso que a tramitação deve ser normal, de 90 a 120 dias, para que haja uma ampla discussão do projeto com técnicos e a sociedade civil e a realização de audiências públicas”, emendou Gelmi.
FOLHA NOTÍCIAS (FN) – Como você vê esta questão da tramitação do PLC na Câmara?
JULIANO FERRAGUTTI (JF) A decisão é da Câmara. Já me coloquei à disposição, e toda minha equipe técnica também, para tirar qualquer dúvida dos vereadores, apesar dos quatro anos de discussões, das mais de 100 horas de conversas só com os delegados (representantes de todas as regiões da cidade) e todas as horas de discussões dos técnicos. Sei que 2020 é um ano eleitoral. O regime de urgência é por conta deste momento político. O assunto deve gerar mais conversas, mas não podemos deixar passar muito tempo. Espero que a Câmara seja mais imparcial possível, procure a nossa secretaria para tirar dúvidas e faça as audiências necessárias. Já fomos surpreendidos há alguns meses com uma ação do Tribunal de Justiça de São Paulo que derrubou o TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) que limitava a implantação de loteamentos fechados, prédios e condomínios na cidade. O prefeito Jaime Cruz foi obrigado a derrubar este decreto, por determinação da Justiça. Não podemos ficar abertos a qualquer tipo de empreendimento que quer se instalar em VINHEDO e o novo Plano Diretor impõe regras duras para estes empreendimentos.
FN – Como evitar interferências políticas na revisão do plano?
JF – A primeira fala do secretário Adriano Corazzari quando eu assumi a Secretaria de Meio Ambiente e Urbanismo, em 2018, foi: “Quando retomar o Plano Diretor, não deixe que a política contamine um processo tão importante para a cidade”. Eu era chefe de gabinete dele. Espero que os debates na Câmara sejam técnicos e que grupos ligados a partidos políticos não interfiram no processo, como não interferiram na fase de revisão do Plano Diretor. Chegaram a falar que o plano estava sendo feito nos corredores da prefeitura por empreendedores. O projeto de VINHEDO é um dos mais restritivos do Brasil, por isso questiono: será que ele foi mesmo feito por empreendedores? Ou por grupos políticos? Foram mais de 100 horas de discussões com a sociedade civil. Que se respeite a opinião dos 97 delegados que discutiram o plano. A maior “vacina” contra a interferência política é a discussão técnica. O Poder Executivo não tem nenhuma participação nas propostas deste plano, seja na alteração do zoneamento, no uso e ocupação do solo. O Executivo só propôs corrigir pontos do plano de 2006, como a criação de corredores comerciais e questões específicas de legislação. Estas 97 pessoas merecem respeito, pelo longo trabalho de quatro anos que fizeram nesta revisão, e que sejam ao menos consultadas sobre qualquer alteração vinda da Câmara. Que a política, ou melhor, a politicagem, não tome conta desta discussão que agora está no Legislativo.
FN – O que foi mantido do plano de 2006?
JF – A estrutura do plano vigente foi preservada, com a manutenção da limitação das zonas de conservação ambiental, por exemplo. O lado participativo também foi amplamente mantido, assim como o Conselho de Políticas Urbanas. O fundo de políticas urbanas já existia, mas não se sabia como o dinheiro entraria. Fizemos isso agora na revisão e incluímos outro ponto fundamental – o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV). O Plano Diretor de 2006 é interessante e foi elogiado na ocasião, mas precisava ser melhorado. Na questão de mobilidade, a proposta antiga previa ampliação e alargamento de vias, sem revelar de quanto seria a expansão. O Estudo de Impacto Ambiental foi outro ponto aprimorado agora.
FN –Como foi conduzir as discussões do Plano Diretor?
JF – Foi um desafio e um aprendizado para mim. Normalmente sou “pilhado”, mas nas reuniões, quando eu pegava o microfone para falar, ficava bem calmo. Olhava nos olhos dos delegados e de quem contestava algo e buscava o diálogo e o esclarecimento. Vi momentos tensos sim, como uma vez em que moradores protestaram contra determinada questão com baldes em cima das cabeças. Mas estou certo de que estamos no caminho certo para termos um Plano Diretor de qualidade, pela grande participação da sociedade nas reuniões.
FN – E a questão hídrica da cidade?
JF – Tem muito vereador que fala sobre a questão hídrica em VINHEDO, que é realmente crucial. Para a implantação de um novo loteamento na cidade, este loteador terá que fazer um Estudo de Viabilidade Hídrica. Se ele não conseguir provar que é possível ter água, gerar a água através de investimento no sistema de saneamento com recurso próprio, a ideia do novo Plano Diretor é que ele não receba autorização para aprovação de seu loteamento. Todo investimento terá que fazer o depósito de um valor correspondente a 2,5% do custo total da implantação do empreendimento no Fundo de Desenvolvimento Urbano. Este dinheiro será usado na melhoria e ampliação da infraestrutura urbana do município. Hoje, pessoas vêm para a cidade, tiram todo o lucro dela, colocam seu canudinho na bica da Sanebavi, levam a água e o dinheiro e vão embora. Agora, estes 2,5% serão investidos em mobilidade, saneamento, meio ambiente, asfalto… Será um grande ganho para a cidade.
FN – O Fundo de Desenvolvimento Urbano foi a principal mudança da revisão?
JF – Foi uma das principais. As outras novidades são a obrigatoriedade de feitura do Estudo de Viabilidade Hídrica, talvez a principal mudança; medidas estruturais e não estruturais do Plano de Macrodrenagem para a área indiretamente afetada com raio de dois quilômetros; recuperação de nascentes; deixar mais áreas permeáveis na cidade; aumento da área de permeabilidade de empreendimentos multifamiliares verticais para 40% da área do terreno (hoje este percentual previsto é de 15%), com obrigatoriedade de plantio de árvores; pavimentação permeável em todas as modalidades de empreendimento e a implantação de caixas de infiltração e/ou reuso de água. Tudo isso vale para uma casa ou para um condomínio, seja ele vertical ou horizontal. O aumento da área de permeabilidade facilita a infiltração de água no solo e o reabastecimento do lençol freático, entre outras vantagens.
FN – A questão da água vai ser equalizada na cidade, acabando com o “fantasma” do problema da água em VINHEDO?
JF – É estranho este “fantasma” voltar todo ano. Ele não some nunca na cidade. Temos um plano de sustentabilidade hídrica que indica todas as ações que devem ser tomadas a curto, médio e longo prazo. Temos ainda muitas ações para fazer, das mais simples às mais complexas. Estas últimas seriam a construção de novas represas e o desassoreamento das mesmas, para resolver de vez o problema da água em VINHEDO.
FN – Outras obras necessárias para nosso município também estão previstas no Plano?
JF – Temos a transposição do Córrego Bom Jardim, um dos principais mananciais do município, que identificamos no ano passado e é onde chega mais água para a Represa 1. Só nessa transposição, jogada a céu aberto, perdemos 57% da água que chega na represa. A perda, comprovada por estudos que fizemos, ocorre nos brejos que passam por dentro da Fazenda Cachoeira. A água vem tubulada até o alto do Cajaranas e é jogada ali por gravidade. Mais da metade se perde. Estes 57% da água poderiam manter a Represa 1 cheia o ano inteiro, mesmo na época de estiagem. Estamos trabalhando neste projeto de canalização para resolver este problema, junto com o secretário de Obras, Adriano Corazzari. Ainda em 2020 esta obra deve ser iniciada.
FN – E se isso for resolvido?
JF – Se isso for resolvido acabará só um terço do problema. Os outros dois terços ficam por conta do excesso de areia dentro da Represa 1, que em dia de chuva vem da erosão na Fazenda Cachoeira provocada pela obra de duplicação da avenida que vai para o Cristo, no caminho de Itatiba. A obra é de 2006 ou 2007. A erosão tem 30 metros de profundidade por 50 metros de comprimento e é um negócio horrível. Ali faltaram planejamento e visão de futuro. Em 2019, tiramos areia da Represa 1 numa profundidade de 1,2 metro. A transposição do Córrego Bom Jardim está no Plano Diretor, assim como o barramento na região da Santa Cândida, ou seja, uma nova represa no Santa Cândida.
FN – A redução da perda na distribuição de água também é um objetivo previsto na revisão?
JF – Certamente. Esta perda é a maior responsável pela nossa escassez hídrica. Hoje ela chega a 33% e, em 10 anos, conforme está no plano, queremos baixar este percentual para 20%, algo trabalhoso, mas perfeitamente possível. O combate a esta perda será feito com o dinheiro dos 2,5% do custo total da implantação do empreendimento no Fundo de Desenvolvimento Urbano. O Estudo de Viabilidade Hídrica será fundamental para colocarmos tudo isso em prática. Um empreendimento novo tem que prever se usará água da cidade ou se poderá garantir o abastecimento com recursos próprios.
FN – E quanto ao esgoto?
JF – Há uma questão ligada ao esgoto vinculada diretamente à água e que está no Plano Diretor de VINHEDO. Podemos pegar esgoto e água juntos e, no tratamento do esgoto, reverte-se a água para um novo tratamento, visando o reuso. Já temos tecnologia avançada para deixar essa água 100% pura e potável. Tem ainda a ampliação das ETEs, que são as estações de tratamento de esgoto. A cidade não tem uma carência tão grande de tratamento de esgoto.
FN – Não se pode falar em Plano Diretor sem pensar no nosso Distrito Industrial, certo?
JF – Correto. Fizemos uma melhoria nas redes de água e de esgoto do Distrito Industrial para que possamos ter nele um polo de empresas de alta tecnologia, aproveitando o “boom” deste segmento. Estas empresas têm baixa pegada hídrica, são sustentáveis e possuem baixo índice de poluição. Os delegados do Plano Diretor ainda apresentaram uma proposta de implantação de um “porto seco” (terminal intermodal terrestre diretamente ligado por estradas) no Distrito, aproveitando o fato de a cidade estar num eixo estratégico, com as rodovias Anhanguera e Bandeirantes, e próxima de São Paulo, Campinas e do Aeroporto de Viracopos. VINHEDO é um local privilegiado, no centro do desenvolvimento do Brasil. O Plano Diretor foi pensado também para atrair empresas que gerarão empregos e renda e trarão turistas e novos negócios. Estamos seguindo o tripé da sustentabilidade – economia, social e ambiental.
FN – O Cemitério Municipal, que está saturado, foi mencionado na revisão?
JF – O problema da “superlotação” do cemitério de VINHEDO não está entre os itens da revisão do Plano Diretor. Hoje a tendência em outras cidades é de cemitérios verticais e esta pode ser a saída para nossa cidade, mas isso ainda sofre resistência por parte de muitos munícipes. Tem também técnicas de ressecamento de corpos sem que se contamine o lençol freático ou se emita gases poluentes. A prefeitura estuda a questão e quer resolvê-la o quanto antes e de forma sustentável.
FN – O que pode falar do projeto cicloviário da cidade?
JF – A ampliação das ciclovias da cidade foi contemplada pelo Plano Diretor. Mantivemos a expansão para o Canudos e Três Irmãos, descendo em direção à Capela. A mobilidade é uma área importante da revisão feita nestes últimos anos.
FN – Este projeto em que você está envolvido projeta a “VINHEDO do futuro”?
JF – Sim. Acho que esta revisão do Plano Diretor se manterá atual por 40 anos. O Estudo de Viabilidade Hídrica, por exemplo, é o grande “gatilho” da nossa proposta, um pedido inclusive do promotor Rogério e de outros setores. Nada será feito em VINHEDO sem a comprovação de que há água para abastecer. Vamos afastar este “fantasma” de que nossa cidade não tem água e que para ela ser uma realidade para todos vai demorar 20 anos. Temos ainda a proposta de desassoreamento de nascentes no plano, que é possível e não é cara. Não é só fazer, temos que fiscalizar e manter.
FN– Gostaria de fazer algum agradecimento?
JF – Claro que gostaria. Esse plano foi construído para a VINHEDO dos próximos 40 anos, repito. E com a importante participação da sociedade. Aproveito para agradecer aos 97 delegados que ajudaram a fazer um projeto combativo, que vai corrigir erros do passado. Estes delegados escreveram seus nomes na história, além de um marco na vida do município.
SERVIÇO
ALGUMAS PROPOSTAS DA REVISÃO DO PLANO DIRETOR
– Estudo de Viabilidade Hídrica
– Depósito de 2,5% do custo total de implantação do empreendimento no Fundo de Desenvolvimento Urbano, para uso no melhoramento e ampliação da infraestrutura urbana do município
– Para empreendimentos passíveis de diretrizes urbanísticas, serão exigidas as ações previstas para a área no Plano de Sustentabilidade Hídrica e as medidas estruturais e não estruturais do Plano de Macrodrenagem para a área indiretamente afetada com raio de 2 km, do ponto central do empreendimento
– Obrigatoriedade de qualquer modalidade edilícia implantar caixas de infiltração e/ou reuso de água
– Além de toda infraestrutura já obrigatória, foi acrescido que a pavimentação deverá ser permeável em qualquer modalidade de empreendimento
– Criação da modalidade de Empreendimento Sustentável (Ecovila) com restrição quanto à ocupação máxima, obrigatoriedade de recuperação da área remanescente e execução de toda obra desde a implantação de forma sustentável
– Criação do IPTU Verde para cidadãos que forem autores de boas práticas ambientais – telhado verde (com plantas), reuso da água da chuva para regar plantas e o jardim, além de lavar calçadas e carros etc
– Criação do Programa de Reflorestamento Ciliar e Recomposição Vegetacional das Áreas de Preservação Permanente (APPs), os quais devem observar as diretrizes do Plano de Sustentabilidade Hídrica
– Criação do Programa de Conservação dos Solos e dos Recursos Hídricos, no qual serão implementados o Projeto de Recuperação e Preservação de Nascentes, o Plano de Combate à Erosão, o Programa de Desassoreamento de Nascentes, o Projeto de Recarga e Produção de Água e o Plano de Macrodrenagem
– Prazo para a implantação do Código de Meio Ambiente
– Demarcação dos corredores previstos no Projeto Reconecta RMC
– Obrigatoriedade de regulamentação da Lei do PSA (Pagamento de Serviços Ambientais) e da Lei de Preservação de Nascentes e Mananciais
– Aumento da área de permeabilidade de empreendimentos multifamiliares verticais para 40% da área do terreno, com obrigatoriedade de plantio de árvores
– Redução das perdas de água tratada para 20% nos próximos 10 anos
– Estudos para reversão de bacias
– Implantação de nova represa na Santa Cândida e melhorias nas Represas I, II e III
– Recuperação das áreas de preservação permanente para condomínios e loteamentos já implantados num prazo de três anos
– Recuperação das áreas de preservação permanente nas áreas rurais em cinco anos
(Texto: Paulo Behr – Redação FOLHANOTICIAS /Imagens:FN10/PMV/CMV)